UFC: quem é o treinador que ‘salvou’ a vida e criou Poatan para o kickboxing

Igor Ribeiro | 07/04/2023 - 08:00

Primeiro treinador de kickboxing de Alex Poatan, Belocqua Wera é um guerreiro da vida. Ele teve que superar uma origem sem grandes holofotes até construir sua academia em São Bernardo do Campo, na zona sul de São Paulo, adquirindo muita história para contar ao longo da jornada. E como um bom guerreiro, tem o orgulho de sua ancestralidade, que mudou a vida do atual campeão dos pesos-médios (até 83,9 kg). 

A história do herói todos contam, mas boa parte não conhece a do mentor. Por isso, o Quinto Quarto BR revive a memória de Belocqua, o homem que salvou a vida e criou Poatan para o kickboxing.  

– As artes marciais na minha vida já vêm de berço. Onde eu nasci você tinha que ser forte para sobreviver. Meu pai, logo de cara, passou a mostrar os treinamentos, que eu até uso hoje. Eles são a base do que eu uso para formar os campeões. E foram os ensinamentos que eu usei para formar o guerreiro Poatan. ‘Não ao vira-latismo’. É o que eu sempre preguei. Antes de ser campeão, Alex chegava ao lado dos caras relevantes, como Mirko Cro Cop (ex-campeão do K1 e PRIDE). Um dia, eu estava com ele em Zagreb, na Croácia. Outro dia, eu estava esperando um ônibus em São Bernardo. Minha realidade é essa. A luta do dia a dia. É a realidade de começar a trabalhar 7h e terminar 23h. E contar o dinheiro para seguir com o aluguel da academia -, relatou.  

Além de Poatan, Belocqua também ajustou o jogo de Paulo Zorello 

Mentor de Poatan no kickboxing, Wera também foi importante na construção de jogo de Paulo Zorello – grande nome brasileiro na modalidade e multicampeão nos super pesos-pesados. Belocqua se orgulha ao lembrar dos trabalhos realizados.  

— Dois grandes trabalhos que eu tenho na minha vida foram no kickboxing, com Paulo Zorello e Alex Poatan. O trabalho foi bom, pois o Zorello era um lutador que eu falava e ele fazia. Veio o Alex para treinar comigo e vi que ele tinha talento para se destacar também. Vi o Paulo idealizar o WGP (circuito de kickboxing na América Latina) –, conta.

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A memória de um guerreiro nunca morre

Belocqua Wera, com 68 anos, atualmente trabalha no incentivo dos lutadores de sua academia. O tempo foi doloroso. Dores no nervo ciático fizeram com que as manoplas se tornassem mais difíceis. Mas ele ainda segue forte. E fez questão de exibir sua movimentação na academia.  

O trabalho com Poatan 

Já consagrado como treinador, Belocqua Wera sempre seguiu a ancestralidade como ponto de ligação entre a terra e o céu. Com esse pensamento, recebeu um jovem Alex Pereira, aos 21 anos, com problemas com o álcool.  

A conexão fez com que não deixasse a oportunidade passar e cuidasse de Poatan – apelido dado por Wera – como um filho. Assim, fez dele um campeão.  

— Ele começou a treinar tarde, com 21 anos, um cara que bebia um litro de pinga e eu via a possibilidade de se tornar um campeão. O Alex dançou comigo. É onde você entra em conexão com nossos ancestrais. Ele entra (no octógono) com um movimento dos animais e postura do guerreiro. Não falar muito, mas fazer. Quando você vê um brasileiro lá fora, ele tem dois tipos: o arrogante e o malandro. Você tem que ter a postura do guerreiro e ser sereno e pronto. –, aconselha Wera.

Alex Poatan e Belocqua Wera. Foto: Arquivo Pessoal
Alex Poatan e Belocqua Wera. Foto: Arquivo Pessoal

Diamante lapidado 

Hoje campeão do UFC, Poatan era um diamante a ser lapidado e precisava de uma conversa franca para evoluir. A conversa veio com Wera, que o trouxe para o mundo do kickboxing e mostrou que havia um caminho para o sucesso. O processo, no entanto, dependia do esforço do pupilo.  

— No momento em que eu mais exigia do Alex (Poatan), em algumas derrotas no início do kickboxing, eu vi que poderia ter um campeão ali. Mas ele precisava estar ali, focado e comigo. Chamei ele para uma conversa e questionei o que ele queria. Ele não tinha noção nenhuma de onde poderia chegar e eu o mostrei um caminho que poderia trilhar até o K1 ou almejar um título mundial de boxe. Ou o MMA. E ele falou que fechava comigo — 

O rompimento 

Belocqua Wera foi o grande mentor de Alex Poatan no kickboxing e o introduziu no esporte em 2008. Após a recuperação do pupilo, o treinador mostrou as técnicas que seriam evidenciadas no Glory, principal organização da modalidade no mundo.  

Além da consagração no kickboxing, Poatan também teve o apoio de Belocqua para as vitórias no Campeonato WGP (principal circuito profissional de kickboxing da América Latina), It’s Showtime e WAKO Pro antes do rompimento com o profissional, que aconteceu em 2014. Questionado sobre o assunto, o mestre garante não ter mágoas do campeão. 

– Eu estive com Poatan até ele fazer 26 anos. Ele estaria pronto para lutar no boxe ou no MMA e assim ele foi. Permaneceu no GLORY. Chamei ele para uma conversa e, quando ele estava meio perdido, começou a faltar nos treinos. De repente, ele veio falar que gostaria de sair. Nunca comentei nada em rede social e não fiquei chateado. Minha personalidade de guerreiro me permite pensar de forma diferente. O que eu quero é que ele represente a família dele e os ancestrais -, concluiu.  

Belocqua Wera não está mais com Alex Poatan e mantém relação distante, mas ainda sente ter ajudado um pupilo. E vai estar na torcida no UFC 287, na revanche contra Israel Adesanya, pelo cinturão dos pesos-médios (até 83,9 kg). O trabalho não morre jamais. O orgulho por criar um grande campeão, também. 

Escrito por Igor Ribeiro
Igor Ribeiro é especialista em lutas e MMA e começou a carreira na área como redator e repórter do site Super Lutas, até se tornar coordenador. Foi reporter do Quinto Quarto até julho de 2023.
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