Antes de Ronda Rousey deixar seu legado no UFC. Antes de Amanda Nunes ser uma lenda do MMA. Havia uma brasileira que deixava o mundo boquiaberto e poucas mulheres tinham coragem de a enfrentar: Cris Cyborg.
A única mulher a conseguiu um Grand Slam no MMA tem nome, sobrenome e apelido: Cristiane Justino Venâncio, mais conhecida como Cris “Cyborg”. Já foi campeã do Strikeforce, Invicta, UFC e Bellator. Muitos a consideram a maior lutadora de MMA de todos os tempos e não é para menos. São 25 lutas, sendo 22 vitórias, duas derrotas e uma luta sem resultado, quando venceu a japonesa Hiroko Yamanaka, mas foi pega no doping.
É uma das lutadoras mais antigas da modalidade e uma das mais vitoriosas de todos os tempos. Seu legado está aí e ninguém tira. Sua primeira derrota foi logo na estreia, quando foi derrota no Show Fight 2 para a também brasileira Erica Paes, com uma finalização de perna. Desde então, tornou-se uma máquina: Cyborg, literalmente. Porém, o início no esporte não foi nas lutas, mas, sim, no handball.
A força no braço em outro esporte
Cris Cyborg começou em outro esporte que exige força no braço. Assim, teve um bom desempenho no handball desde o 12 anos, conquistando uma bolsa de estudos em um colégio particular. Posteriormente, quando pensou em cursar Educação Física, descobriu o Muay Thai.
Eu estava participando de um torneio amistoso de handball entre homens e mulheres e um dos rapazes, chamado Jorginho, era amigo de mestre Rafael e do mestre Rudimar. Ele me viu treinando handball e me perguntou se eu gostava de luta. Respondi que achava legal, mas nunca tinha feito. Ele me convidou pra fazer uma aula de Muay Thai e eu gostei!
Aos 19 anos, como dito anteriormente, iniciou com derrota. Mas daí por diante foram 14 anos de invencibilidade. No Brasil, despachou Vanessa Porto, Chris Schroeder, Elaine Santiago e Marise Vitoria. Com exceção de Vanessa, as outras três foram derrotas por nocaute e no 1º round. Em 2008 estreou no Elite XC e bateu a americana Shayna Baszler e a japonesa Yoko Takahashi. Eis que encantou o Strikeforce, que imediatamente a contratou.
O começo da Dinastia Cyborg
Estreou no Strikeforce contra Hitomi Akano e não desperdiçou sua primeira grande chance. Nocauteou a japonesa no 3º round com uma sequência de socos. Então foi colocada para enfrentar a americana Gina Carano, conhecida como “O rosto do MMA” e invicta com sete vitórias consecutivas.
Ambas com sete triunfos, mas não deu para a estadunidense. Cyborg a nocauteou no 1º round. Assim, Cristiane Justino faturava o Cinturão dos Penas Femininos inaugural da franquia, em 15 de agosto de 2009. Defendeu o cinturão dos penas frente a holandesa Marloes Coenen, em 30 de janeiro de 2010, no 3º round, também por nocaute.
A americana Jan Finney foi outra que tentou a derrubar, mas sem sucesso: nocauteada com joelhada e socos. Também venceu a nipônica Hiroko Yamanaka, mas foi pega no doping em 6 de janeiro de 2012. O exame acusou a presença da substância proibida estanozolol. Cristiane foi punida com suspensão de um ano e perdeu o cinturão.
O regresso da máquina de espancar
Retornou aos octógonos em 2013, no Invicta 5 contra a neo-zelandesa Fiona Muxlow, mantendo a sina de nocauteadora. Coenen teve nova chance, mas também não foi párea, outra vez nocauteada. Disputavam o cinturão dos penas e ficou na mão da brasileira. Defendeu o cinturão até migrar para o UFC com vários nocautes: a canadense Charmaine Tweet, a neo-zelandesa Faith Van Duin e a russa Daria Ibragimova.
A público pediu e Dana White atendeu: Cyborg no UFC
A maior franquia de MMA do mundo não tinha categoria para Cris Cyborg, portanto, tendo que lutar em peso casado. Nocauteou a americana Leslie Smith, e a sueca Lina Lansberg em 2016. Quando lutou pelo cinturão dos penas vago contra a americana Tonya Evinger, não teve outra: nocaute. Defendeu pela primeira vez contra a forte e ex-campeã dos galos, Holly Holm.
Numa luta épica, entre duas atletas que sabem o gosto de segurar um cinturão, o pau quebrou. Uma incrível luta de 5º round e para os amantes de lutas terem gosto de ver. A multicampeã de boxe versus a lenda brasileira do MMA.
Uma luta em que Cyborg dominou do começo ao fim, mas desta vez não conseguiu nocautear: vitória por decisão unânime, título defendido e prêmio de luta da noite para as lutadoras. Depois destruiu a russa Yana Kunitskaya com nocaute no 1º round.
As maiores lutadoras de todos os tempos frente a frente
A luta que todo mundo queria ver, então, foi armada para acontecer. De um lado Cris Cyborg, detentora do cinturão dos pesos pena do UFC. Do outro, a desafiante, Amanda Nunes, também brasileira, pronta para o combate. A “Leoa” era a desafiante e subiu de categoria (cerca de 4,5 quilos) para enfrentar a “máquina” dentro de seu território, no dia 29 de dezembro de 2018.
Mas o feitiço virou contra a feiticeira. Acostumada a nocautear, Cyborg nunca havia sido nocauteada. Extremamente compenetrada, Amanda Nunes não deu sopa para o azar e nocauteou sua compatriota em 51 segundos. A luta que vendeu muito e era considerada a maior de todos os tempos, se resumiu em menos de um minutos, mas valeu todo o investimento e o marketing.
A despedida do UFC e o prestígio no Bellator
Cyborg voltou aos octógonos em 27 de julho de 2019 para enfrentar a canadense Felicia Spencer, vencendo por decisão unânime no UFC 240. Mas, após aquela luta, a brasileira, que nunca sentiu-se prestigiada por Dana White, decidiu por não aceitar uma revanche com Amanda Nunes e mudou-se para o Bellator.
Na nova franquia, estreou em 25 de janeiro de 2020, contra a canadense Julia Budd e voltou a vencer por nocaute no 4º round, conquistando sua 22ª vitória na carreira. Para quem pensa que a rival era uma simples lutadora, se engana. Budd estava invicta desde 2012, ainda pelo Invicta. Eram 11 vitórias consecutivas e três defesas de cinturão Cyborg aparecer em sua frente. Após a luta, a brasileira desabafou sobre o UFC e enfatizou: “Me sentia como uma escrava no UFC”.
A “escravidão” no UFC e a relação com Dana White
A relação entre o presidente do UFC, Dana White, e a lutadora nunca foram mil maravilhas. Se por um lado Cris se sentia escrava, Dana dizia que a relação era um “pesadelo”:
Lidar com a ‘Cyborg’ tem sido um pesadelo durante todos esses anos. Havia muita controvérsia antes de contratá-la e, mesmo assim, nós assinamos com ela. Mesmo após ela testar positivo para esteroides anabolizantes. Nós a tornamos uma atleta limpa com a melhor política antidoping em todos os esportes. Então, quando ela fala sobre o seu legado e sua marca, nada foi melhor para o seu legado do que ser reconhecida como uma lutadora limpa, enfatizou em coletiva ao ‘Contender Series’.
Antes de entrar no UFC, havia sido vítima de bullying por parte de Dana White: “Ela parece o Wanderlei Silva (lutador brasileiro de MMA) de vestido”. Já Joe Rogan, comentarista oficial da organização, chegou a dizer em um podcast que Cyborg tinha “genitária masculina”. Tais declarações pesam e podem ter sido fatores fizeram com que Cris Cyborg não tenha renovado com a franquia.
Tenho muitos problemas com o UFC. Não quero reclamar de nada, mas tem muitas coisas que precisamos trabalhar. Dana White faz bullying comigo toda hora. Dizer que eu estava com medo e não queria enfrentar Amanda é uma mentira, e isso machuca a minha imagem. Não quero que machuquem minha imagem, quero alguém que trabalhe junto comigo. Minha filha quase brigou na escola por causa disso. Uma criança disse algo sobre mim, e eu disse para ela que não pode brigar, mas isso não é legal. As pessoas veem na mídia os outros dizendo besteira e dizem, ‘sua mãe tem um pênis!’ Isso incomoda ela e me incomoda, relatou a brasileira.
Foto destaque: Reprodução/Tribuna Paraná