NBA e NFL: A lucrativa máquina de fazer dinheiro da indústria dos esportes americanos

Eduardo Barão | 28/03/2024 - 14:57

O que faz um time esportivo valer muito dinheiro na NBA ou NFL? Tradição? Número de títulos? Torcedores? Reconhecimento pelo mundo? Ingressos? Ou seria a venda de produtos, como camisas? E se eu te contar que o bem mais inestimável para um clube é sua própria imagem?

A Forbes, publicação conhecida por suas listas de bilionários, lança anualmente um guia com os 50 times mais valiosos do planeta. Na versão 2023, os tais 50 times valiam somados nada menos que 256 bilhões de dólares, uma média de 5,12 bilhões cada um. E se você está aqui no Quinto Quarto já deve ter sacado que essa reportagem não é sobre nenhum time de futebol europeu – a realidade é que, dos 15 times no topo da lista, apenas 3 são do futebol, com o Real Madrid liderando essa categoria e ocupando o nono lugar no geral.

Top 10 franquias mais valiosas (os valores são em bilhões de dólares):

  • 1º Dallas Cowboys (NFL) – 9,20
  • 2º New York Yankees (MLB) – 7,10
  • 3º Golden State Warriors (NBA) – 7,00
  • 3º New England Patriots (NFL) – 7,00
  • 4º Los Angeles Rams (NFL) – 6,90
  • 5º New York Giants (NFL) – 6,80
  • 6º Chicago Bears (NFL) – 6,30
  • 7º Las Vegas Raiders (NFL) – 6,20
  • 8º New York Knicks (NBA) – 6,10
  • 8º New York Jets (NFL) – 6,10
  • 9º Real Madrid (FIFA) – 6,07
  • 10º Washington Commanders (NFL) – 6,05

Para efeito de comparação, o Flamengo, clube brasileiro mais valioso, teria valor de mercado de R$ 4,5 bilhões (cerca de 900 milhões de dólares – muito longe ainda dessa listinha aí acima).

Mas como é possível uma liga “local”, com um esporte em que a maioria das pessoas do planeta não entende bem as regras, dominar esse ranking? Como funciona o modelo de negócio norte-americano que traz tanto dinheiro para seus times? Guilherme Buso, professor de marketing esportivo e mestre em gestão do esporte, explica:

— O modelo americano esportivo destoa do mundo inteiro. Porque, diferente da maioria dos países, principalmente Europa e América Latina, onde o modelo esportivo é baseado em federações e o modelo de clubes, lá nos Estados Unidos a formação é feita nos colégios. Você tem alguns clubes de formação, mas a grande base é desenvolvida nos colégios, depois nas faculdades, para depois chegarem nos profissionais. E isso faz com que a capilaridade do esporte americano seja absurda, impressionante. A quantidade de crianças e adolescentes que praticam esportes de alto rendimento, em competitivo, é muito alta. (…) Você tem uma cultura esportiva muito enraizada, né? Imagine que toda essa gama de atletas continua consumindo o esporte, ela continua indo nos jogos, vendo pela TV. Então a indústria esportiva é muito grande. Há um entendimento de que o esporte é mais do que o esporte, ele é um entretenimento. Com o passar dos anos as ligas profissionais começam a crescer demais e ganhar o espaço que elas têm hoje, são realmente as maiores marcas do esporte mundial — disse Buso.

Mas de onde vem tanto dinheiro? Como esses times se tornaram tão ricos? A palavra-chave é uma só. Direitos. Pois é, direitos de transmissão de seus jogos, negociados em conjunto e distribuídos igualmente entre todos os times da liga.

Roger Goodell, executivo da NFL
Executivo da NFL, Roger Goodell viu Las Vegas ampliar as receitas da NFL. Foto: Icon Sport

A NBA, por exemplo, tem acordos de transmissão nos Estados Unidos com a ESPN e a Turner Sports que rendem cerca de 2.66 bilhões de dólares por temporada, que se somam a outros 500 milhões de dólares vindos das transmissões internacionais. O consenso entre especialistas é que esses valores só aumentam conforme novos players entram na cena (alô Apple, Amazon Prime e YouTube TV).

Na NFL, os acordos realizados nacionalmente, que incluem direitos de transmissão, licenciamento e merchandising, trouxeram 374.4 milhões de dólares para cada time na última temporada. A Liga de Futebol Americano tem contratos com Amazon, CBS, ESPN/ABC, Fox e NBC que valeriam mais de 100 bilhões de dólares. 

Voltando para o Brasil, na última temporada, os direitos do Brasileirão custaram 420 milhões de reais (ou aproximadamente 84 milhões de dólares) – para todos os jogos, dinheiro este que é dividido entre os times de acordo com o potencial de audiência. É uma quantia bastante relevante, mas que não é realidade para o esporte nacional fora da Série A do futebol. Buso explica que, “para as modalidades fora do futebol, o direito de mídia pode trazer uma receita significativa, mas não é a maior fatia da receita global. Hoje as principais equipes esportivas vivem basicamente de patrocínio. A depender do modelo de cada clube, cada um tem a sua fonte de receita de uma forma distinta, mas não é receita de ingresso, muito menos de produto licenciado e nem de transmissões”.

Mais um ponto para o esporte norte-americano. Por lá, uma fonte constante de receita para os times são os ingressos. Na NBA, são 41 jogos em casa na temporada regular, enquanto na NFL são apenas 8 ou 9 – mas em estádios com uma média de 70 mil lugares. Ainda que sejam números que não podem ser ignorados, não há nesse universo muito espaço para crescimento sem que o preço do ticket suba demais. A solução aparece em espaços premium, como camarotes: quanto mais moderna uma arena, mais possibilidades ela vai ter de atrair o espectador endinheirado para uma experiência VIP. E foi buscando esse tipo de solução que fez o Oakland Raiders virar Las Vegas Raiders.

Mudando de ares: Las Vegas e as possibilidades para NBA e NFL

Já que o grosso da receita vem das transmissões, para alguns times a proximidade física com o torcedor raiz pode ficar em segundo plano: grandes reformas ou até a construção de um novo estádio muitas vezes dependem de subsídio público, e a negativa de uma cidade em contribuir nessa conta pode ser o empurrão final para a realocação de uma franquia.

Libby Schaaf, prefeita de Oakland de 2015 a 2023, afirmou diversas vezes que a cidade não teria fundos para a construção de um estádio que substituísse o tradicional Oakland-Alameda County Coliseum, um dos mais antigos da NFL.

Dinheiro fala né. O Estado de Nevada então aprovou 750 milhões de dólares em financiamento público para custear um novo estádio, o Allegiant Stadium – esse dinheiro veio de um aumento justamente no imposto nos quartos de hotel na cidade. A nova casa dos Raiders custou cerca de dois bilhões de dólares; o restante do dinheiro veio de um empréstimo do Bank of America (600 mi), da própria NFL (200 mi) e de acordos de licenciamento e patrocínio.

A justificativa para tamanho gasto seria um investimento na comunidade: o Allegiant Stadium teria gerado mais de 7900 empregos, gerando um impacto econômico de 1,8 bilhão de dólares, e atraindo ainda 1,7 milhão de fãs para a cidade apenas em 2022.

Allegiant Stadium
Localizado em Paradise, Las Vegas, na região oeste dos Estados Unidos, o Allegiant Stadium recebeu o Super Bowl LVIII, em 2024. Foto: Icon Sport

Las Vegas: de Cidade do Pecado a Meca dos Esportes

Em um intervalo de menos de uma década, Las Vegas surgiu como um gigantesco mercado esportivo nos Estados Unidos para além das já tradicionais lutas. Desde 2017, franquias da NHL, WNBA e NFL fincaram os pés por lá (com as duas primeiras já com títulos conquistados na nova casa); a MLB está a caminho com o Oakland A’s, e a NBA deve incluir Vegas nos planos de expansão – Lebron James e Shaquille O’Neal já demonstraram interesse em serem proprietários dessa nova franquia. A cidade ainda recebeu mega eventos, como a Fórmula 1, o Super Bowl, o March Madness e o NBA In-Season Tournament. Se antes havia um receio em estar tão próximo ao mundo dos cassinos, o universo das apostas digitais tem não só ajudado a derrubar preconceitos, como também a financiar e patrocinar atletas e eventos.

Las Vegas sempre foi um destino popular para turistas adultos e para convenções de negócios – um público majoritariamente masculino, procurando impressionar potenciais clientes e promover diversão. Poder oferecer uma experiência em um jogo de NFL ou NHL passa a ser mais interessante do que ingressos ao Cirque Du Soleil ou a um show da Adele.

E o investimento da cidade tem valido a pena: especialistas afirmam que, apenas em 2023, eventos esportivos em Las Vegas geraram 1,845 bilhões de dólares apenas com turismo.

Mas como ficam os torcedores? A paixão pela equipe? A emoção da competição? Guilherme Buso explica.

— O ponto mais importante é como o americano há muito tempo entendeu que esporte é entretenimento, é um produto. A própria NBA não se considera uma empresa de esporte, eles se consideram uma empresa de mídia e entretenimento, onde a temática é o basquete. Então o posicionamento da NBA, da NFL, da própria MLS, dos próprios clubes, é muito diferente daqui e até da Europa. E isso faz toda a diferença na hora de promover o evento, na hora de migrar internacionalmente para outros mercados. Se a NFL agora vai ter o primeiro jogo no Brasil, não à toa, a NBA já fez isso há muito tempo, então é muito interessante ver como eles lidam com o esporte de uma forma muito mais business, muito mais entretenimento do que os outros países — afirma Buso.

Em apenas um final de semana, o Grande Prêmio de Las Vegas rendeu aproximadamente 1,2 bilhão de dólares para a cidade. Verstappen, piloto da Red Bull, resumiu bem: “O espetáculo todo foi 99% show e 1% evento esportivo”.

Escrito por Eduardo Barão
Eduardo Barão é jornalista, radialista, escritor e palestrante brasileiro, com mais de 20 anos de experiência. Atualmente, é correspondente internacional do Grupo Bandeirantes de Comunicação nos Estados Unidos. Apaixonado por esporte, cobriu nos ginásios as últimas finais da NBA.
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